13 de jun. de 2010

Happy End na caserna

Gente, lembra do Laci e do Fernando?
Dois anos após mobilizarem a Polícia do Exército por assumirem homossexualismo, De Araújo e Alcântara vivem tranquilos na Vila Militar
http://www.gay.com.br/files/revistaepoca_sargento_laci_araujo_fernando_figueiredo_01.jpg
LAURA CAPRIGLIONE – FOLHA SP
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA
Eles são celebridades. São gays. Um é sargento do Exército da ativa. O outro, licenciado -pediu baixa. Dois anos após o escândalo que foi a saída deles do armário, Laci Marinho de Araújo, 37, e Fernando Alcântara de Figueiredo, 36, vivem felizes e tranquilos. São a primeira família abertamente homoerótica do Exército brasileiro.
Com a farda de passeio impecavelmente passada, o 2º sargento De Araújo recebeu a Folha às 7h de uma quarta. Preparava-se para mais um dia de serviço no hospital militar de Brasília.
Ao lado do homem fardado, como se repete há 13 anos, estava o companheiro, sargento licenciado Alcântara, que ultimava o café da manhã. Vestia camiseta regata justa, músculos à mostra. Logo, ele também sairia, rumo a uma passeata gay.
Os dois vivem em um apartamento funcional do Exército, no valorizado plano-piloto de Brasília. Não pagam aluguel -só condomínio.
No dia 3 de junho de 2008, De Araújo e Alcântara concediam entrevista à apresentadora Luciana Gimenez, na sede da RedeTV! em São Paulo, quando câmeras colocadas do lado de fora dos estúdios mostraram o cerco ao prédio da emissora, feito por soldados armados com fuzis.
Trilha sonora de terror ao fundo, Gimenez exclamava nunca ter visto nada igual: a Polícia do Exército esgueirava-se pelas instalações da RedeTV! como se caçasse Bin Laden. Ibope nas alturas.
“Eles querem me matar”; “Vou me suicidar para não ir preso”. Em close, o rosto do sargento De Araújo era só desespero, lágrimas e súplicas.
Poucos dias antes, os dois sargentos (Alcântara ainda era da ativa) tinham sido tema de capa da revista “Época”, apresentados como “o primeiro casal de militares brasileiros a assumir sua homossexualidade”.
Segundo o ministro da Defesa, Nelson Jobim, não era discriminação contra homossexuais a prisão ao vivo e em rede nacional. “É uma questão disciplinar. A informação é que esse cidadão [De Araújo] era um desertor e foi preso como tal”, disse.
Pelas regras da caserna, o “sumiço” injustificado de um militar durante oito ou mais dias caracteriza deserção.
Segundo De Araújo, as ausências do serviço, que ele admite, decorreram de um quadro de depressão, tonturas, dores de cabeça e visão turva, que o impediam até mesmo de se sentar à mesa para almoçar ou jantar.
De Araújo tinha de permanecer deitado todo o tempo. Era Alcântara quem lhe dava comida na boca.
Hoje, sabe-se a causa do transtorno. De Araújo, que já fez shows como cover da cantora Cássia Eller, tem epilepsia dos lobos temporais esquerdo e direito. Toma remédios que controlam os sintomas e leva vida normal.
“Normal, bem normal”, concorda a síndica do prédio em que o casal vive. “Eles não são de baladas. Nunca foram”, diz a responsável pela boa ordem no condomínio habitado por 49 famílias de militares (inclui-se a do sargento De Araújo) e 11 de civis.
Foi por essa “normalidade” que os vizinhos não entenderam nada quando agentes da inteligência do Exército, fingindo-se civis, começaram a cercar o prédio -tentavam obter informações sobre o modo de vida dos dois militares gays.
Em uma operação militar que envolveu algo entre dez e 15 homens armados, o apartamento foi invadido. O propósito era prender De Araújo.
“Com um estrondo, os militares estouraram a porta do apartamento. Entraram quebrando tudo”, lembra uma vizinha, mulher de militar, que preferiu não se identificar: “Não precisava. Eles não são bandidos. Vários moradores ficaram indignados”.
A operação era para prender De Araújo, que estava na casa de um amigo, já que não podia ficar sozinho no apartamento quando o companheiro saía para trabalhar.
Segundo Alcântara, “Laci, fraco e doente, estava sendo perseguido pela hierarquia do Exército. Ele não tinha a menor condição de se apresentar. Os laudos de médicos particulares atestavam isso”.
Para os médicos do Exército, o sargento estava em boas condições de saúde.
Dois anos depois, o apartamento deixado semi-destruído pela Polícia do Exército foi reformado pela Prefeitura Militar de Brasília e se manteve como moradia oficial do sargento De Araújo, que o divide com Alcântara (cada um dorme em um quarto).
De Araújo não esconde seus modos delicados ao entrar no hospital do Exército, na Vila Militar, a que se chama de Forte Apache.
A divisa do Exército, “Braço Forte, Mão Amiga”, referência inequívoca a músculos e masculinidade, não impede os soldados fortões da entrada do hospital de prestar continência para o sargento gay. Como aconteceria com qualquer sargento.
No prédio militar, muitos companheiros de farda explicitam a camaradagem -tapinhas nas costas, abraços. De Araújo é um dos responsáveis pelo departamento de recursos humanos do hospital militar. O comandante do setor é só elogios. “Aqui, ninguém está interessado em com quem ele vive, mora ou se relaciona afetivamente. Basta-nos saber que ele desempenha seu papel com denodo e honradez. E ele o faz.”
A Folha questionou o Exército sobre o procedimento-padrão adotado quando um soldado se revela homossexual. A resposta: “O Exército cumpre rigorosamente os instrumentos legais, agindo com impessoalidade e observando os direitos estabelecidos na Constituição Federal, sem discriminação”.
Alcântara pediu baixa para poder falar sobre a condição homossexual nas Forças Armadas. “Se não saísse, cada entrevista acarretaria uma prisão.” Fundou a ONG Abrigo do Ser, que pretende ajudar vítimas de homofobia.
No dia 19 de maio, participou de uma marcha pelos direitos dos homossexuais em Brasília. Não discursou, não se apresentou. Mas foi reconhecido por centenas de participantes, que pediam para ser fotografados ao seu lado.
A bordo de um vaporoso vestido azul, a cantora e atriz Jane di Castro, nascida Luiz de Castro, mal acabara de cantar o Hino Nacional, no encerramento da marcha, quando divisou a figura de Alcântara. Correu até ele só para dizer: “Vocês são meus heróis”. O ex-militar sorriu-lhe, tímido: “Não deixa de ser um happy end, não é?”.

2 comentários:

  1. Fui sargento do Exército por cinco anos e posso afirmar: o Exército não discrimina a opção sexual de ninguém.
    O que não se admite é que se misturem as estações: trabalho é trabalho; fora do quartel cada um faz o que quer, como tem que ser.
    Gostei muito do bom humor do blog: parabéns!
    Vou sempre dar uma lida nas postagens.
    Um abraço.

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  2. We hope you enjoy your stay !
    Be wellcome !

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